O real preço do bucolismo

Rio de Janeiro YIMBY
3 min readNov 19, 2021

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Por Arthur Sarmento

Afinal; o que é bucolismo? Como Insulano em tempo integral pela última vida, sempre ouvi esse adjetivo e me perguntei: o que é bucolismo e por que ele é tão usado para descrever o meu bairro. Seria um grande trunfo desta ilha? Depois de muita procrastinação e muita dúvida, decidi finalmente matar minha curiosidade. não pude ficar mais estarrecido e indignado pelo resultado. Bucólico significa; nada mais, nada menos que o sentimento de um clima pastoral campestre, o que os millenials e genzees chamariam de “cottagecore”. não poderia ficar mais ofendido, como assim esses cavalheiros acham que o meu sprawl de estimação é um local pacato e não é um subúrbio complexo e cheio de nuances e idiossincrassias? Fiquei me devendo essa resposta por este momento.

Tempo passou e a vida me fez finalmente cruzar com o maravilhoso mundo da Associação de Moradores Unidos Contra a Edificação alheia, cujos marcos são: Acusar a prefeitura de corrupção; Fiscalizar toda edificação nova e apontar se há ou não estrutura viária e de mobilidade para os novos moradores da área. Aassociação também gosta apontar erros de código e de engenharia através de seu perito em engenharia, formado em turismo. Mas o que mais me preocupa é o fato deles acreditarem que a ilha é um local bucólico, que deve ser preservado a todo custo e que qualquer mudança urbanística vai destruir a vida e morada deles. Por incrível que pareça, quanto estes são minoria barulhenta e quase coercitiva, que fazem questão de mostrar a todos que querem uma Ilha parada no tempo, e se possível, que exclua o máximo de pessoas diferenciadas o possível através de qualquer meio disponível.

O preço que o insulano paga literalmente é extremamente caro, já que com as investidas dos cidadãos de bem contra a destruição e superlotação da ilha, se criou um lucrativo e muitas vezes criminoso negócio das moradias informais em favelas. Em 2010 estimava-se que 32% (67,084) dos moradores da ilha moravam em favelas, número que pode ter aumentado graças à crise de 2013 e a crise econômica associada à pandemia. Esse número também destoa dos demais bairros da zona norte, que em média tem 15–25% do número de seus residentes morando em favelas. A constante ofensiva contra o adensamento, mesmo que de pequena escala e em áreas que têm infraestrutura para, fez a demanda subir tanto que a construção irregular e muitas vezes perigosa se tornou mais interessante que a habitação, onde existe pleno gozo de serviços e do poder público em si, mas aos olhos desta minoria, o que importa é que a ilha foi salva de um prédio com 36 unidades e 5 andares (30% delas podendo ser de interesse social e mitigando a possibilidade de uma meia dúzia de residências informais serem construídas).

Mas afinal, existe mesmo essa superlotação e falta de “espaço vital” para o adensamento? Em um mundo Rodoviarista, sim. É extremamente difícil e francamente, não deveríamos criar mais estacionamento e sim focar em mobilidade sustentável. Transporte público já faz parte de grande maioria dos insulanos de todas as classes que, ao invés de usar o carro no seu transporte pendular, prefere pegar carona, pegar o ônibus ou a barca. Mas também cabe ao Poder Público recondicionar vias e a infraestrutura preexistente para maior agilidade e melhor atendimento da população. Também cabe ao poder público recondicionar, aprimorar, e expandir seus espaços públicos para uso coletivo, fornecendo um “contrapeso” ambiental às mudanças do ambiente e seu uso.

Outro passo importante dessa transformação está localizado nos próprios edifícios. Não podemos nos enganar e achar que o adensamento em lotes vagos e “virgens” vai resolver. Muito pelo contrário, esses podem representar a faceta nova da empreitada, mas o foco também deve ser feito em aprimorar e usar e abusar do retrofit em prédios já existentes, acrescer unidades em estruturas já existentes diminui muito o impacto ambiental e financeiro associado à destruição e construção de edificações novas. Também não podemos esquecer o fomento a áreas verdes, que fazem grande diferença ambiental e socialmente em comunidades.

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